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O machado de Xangô - a dança vigorosa do poder e da justiça.


O homem grande dança em círculo. Machado, pedreira, força, vigor, equilíbrio-desequilíbrio, agilidade e ação. Na cabeça a coroa. Os pés sempre descalços. Seu poder não estar nas ferramentas. É o fundamento que sustenta a força do seu axé. Farinha, quiabo, gamela. O amalá deve ser comido com as mãos. Seus filhos rezam. Tuas mulheres cantam. Quando o rum soar teremos a sentença final. 

Estamos em tempos de clamar por justiça. Justiça esta que não é apenas por aqueles renegados pelo sistema jurídico. Estamos em tempo de clamar por uma justiça que transcende os limites organizativos humanos. Necessitamos de uma justiça que olhe os desiguais numa perspectiva da equidade. Clamamos pela justiça que não é a limitada da ficção das leis. Essa justiça advém da consciência da nossa humanidade. Humanidade esta negada para os povos africanos e seus descendentes. Desejamos a justiça de Xangô, capaz de enxergar não apenas as ações, mas também as não-ações. 

A pausa ou a inércia, em determinados momentos, podem ser lidas como qualidade ou cumplicidade. Por isso devemos dançar a Dança de Xangô; para que o senso de justiça faça parte da nossa espiritualidade e emane sobre nosso corpo, não deixando espaço para sermos e agirmos de outro modo senão conferindo os direitos a quem é de direito - todos e todas nós!

Por isso eu clamo por justiça para os LGBT+ assasinados e sem nenhum acolhimento e resposta do Estado. Exijo justiça pela vida de Marielle Franco e pela vida de todas as mulheres e homens negros mortos no Pelourinho do nosso tempo. Peço justiça por todas as mães que perderam seus filhos para truculência das ruas. Por todas as mulheres violentadas pelos “Joãos de Deus” da vida e da morte. Peço justiça para os soropositivos que sofreram preconceitos e inúmeras vezes desejaram a morte ao se depararem com repetidas posturas de rejeição. Peço justiça para as mães solteiras, desesperadas, que precisaram realizar um aborto ou para aquelas que morreram ao tentar realizar o procedimento de forma inadequada. Eu peço justiça para Yá Stella de Oxóssi, Odé Káyòdé, que teve sua imagem maculada pela língua de alguns candomblecistas hiper-tradicionalistas e pelos intolerantes e racistas religiosos. 

Quando Xangô dança seu machado corta para todos os lados e ele cobrará, sobretudo, daqueles que dizem que são teus filhos:

Os direitos humanos são mais importantes do que a religião, pois eles visam garantir a dignidade dos homens e mulheres e dão direcionamentos para como as religiões podem se relacionar com seus praticantes sem construir dogmas incongruentes com aspectos como a honestidade, a solidariedade, a paz e a própria justiça. O respeito à dignidade humana não pode estar sob os pés de sacerdotes mal formados. Que desejam tratar seus discípulos como meros serviçais. Violências físicas, psicológicas, humilhações, retaliações e mal tratos fazem parte de ações que eu desejo que sejam julgadas por Xangô e sua sentença seja para a reorientação desses sujeitos equivocados. Que a força de Xangô pese com tal força que nenhum sacerdote e nem nenhum cultuador de Orixá, duvide de tratar seus discípulos e irmãos com a dignidade que merecem. Aos justos, que as lâminas do seu machado passe e nenhuma pele corte. 

Xangô é minha navalha e sempre será. Reconheço as limitações das minha Yá, mas foram os ancestrais que estão ligados a ela que me deram condições de me conectar de modo profundo a Òrí, a Obaluaê e aos meus ancestrais. Xangô é meu Bàbá. Aquele que cuida do meu caminho e me orienta a agir com senso de justiça. Foi Xangô o primeiro a afirmar a sua presença em minha vida quando a dor se fazia presente. Ele não me fez esquecer da sua potência enquanto guardião da minha espiritualidade. Eu bati cabeça em seus pés e ele ouviu o meu corpo. Seu machado pesa e pesa forte, mesmo para seus devotos. Mas quando ele roda também protege e guarda. Guarda principalmente aqueles que seguem o seu ensinamento de dançar equilibrando e desequilibrando para alcançar o força da justiça. 

Obá Xangô. Senhor da minha vida e do meu renascimento. Que teu abraço me conduza sempre à ações coerentes e justas com os meus, com os nossos. Sabemos que o próximo ano será difícil, doloroso e cruel com muitos de nós e, por isso, com todos nós. Assim sendo, desejo que a força de Xangô esteja correndo nas nossas veias, que possamos dar as mãos e dançar vigorosamente. 

Braços dados, firmes e fortes. O mundo pegará fogo, ainda assim o universo estará ao nosso lado. Dançaremos, pois, juntos com Xangô a dança da justiça. 


Kaô Kabecilê Obá!
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